A transmutação de Basaia
Vitória Basaia não se morre, forças da natureza, como ela, apenas transmutam. É uma fase concluída, poesia que termina a estrofe, mas continua. Basaia não se morre. Basaia não só vive, como revive a natureza morta e com sua obra ressignifica a vida. Incorpora outras, todos os rostos terrosos, vermelhos, amarelos e coloridos minerais de sua argila. Argila que encarde às unhas.
Toda fera tem unhas encardidas, afiadas, cheias de sangue e terra batida.
Vitória nasce de todas fendas divinas que esculpe. Entre o sacro e profano, terços, fadas, santas e bruxas. Bonecas, humanas, estátuas, mulheres e meninas. Uma em um milhão, suas faces, fases e luas.
É o feminino sem costelas, arredondados e férteis. É mãe terra. Basaia movimenta a mente, mesmo que por uma escultura estática – que provoca, em imaginação, a dança. A andança de um pensamento até outro, dando às mãos as mentes inquietas, caóticas e, de tão livres, conectadas ao insano.
Foi assim que, em uma de suas mensagens sobre sua morte, escreveu ao filho Julio César. “Quando eu partir, quero bolo, balinha e balão. Não quero reza de ladainha. Quero riso e cantoria. A morte deveria ser comemorada assim como o nascimento. Sou gulosa. Gosto de beijo. Abraço. E prosa“.
Essa é uma homenagem do Cuiabá Tem a sua vida e obra. Constatamos seu retorno para terra, sua verdadeira amiga – na noite desta quarta-feira (15), por ela mesma prevista (um dia) – que sem aviso, sabia como queria ‘viver’, que ironia, até em sua partida.
Sobre a artista
Vitória Basaia foi uma jornalista e artista escultora, gravurista e produtora cultural brasileira, nascida em 1951, no Rio de Janeiro. Ainda na juventude, em 1981, se mudou para Mato Grosso e, depois de Cuiabá, residiu em Várzea Grande, até seu falecimento, em um maio de 2024. Casada, mãe, ativista e multifacetada – que rompeu fronteiras.
Artista plástica autodidata, Basaia desenvolveu pesquisas com pigmentos naturais e materiais recicláveis desde 1985. Em 1992 deu início ao projeto Galeria do Povo, com interferências urbanas em murais, em fachadas de casas, lojas e praças. Enquanto ambientalista, também incorporava em sua arte, além de elementos naturais – materiais de descarte.
A casa da artista funciona como um museu de sua própria arte e, durante todo este tempo, esteve aberto à visitação de estudantes, profissionais da área, artesãos, artistas e demais pessoas que pesquisam e apreciam a arte. O acervo é constituído de mais de mil obras, entre telas, desenhos, esculturas que tratam de temáticas variadas, mas que se sobressaem temas ecológicos, lendárias.